Governo de Honduras tenta privatizar três cidades do país
Porfírio Lobo assinou projeto nesta quinta-feira (6) | Foto: Presidencia/Luis Echeverria
Regiões serão vendidas, terão poderes desvinculados do Estado
nacional e poderão definir até política imigratória própria. Movimentos
sociais qualificam decisão de “catástrofe” e apelam à Corte Suprema
Por Fillipe Mauro,
Classificado pelo governo do presidente Porfirio Lobo como “o mais
importante projeto do país em meio século”, Honduras assinou nesta
quinta-feira (06/09) um memorando no qual aprova a privatização de três
cidades. Com agentes de segurança, sistema tributário e legislação
própria, elas já estarão abertas para investimentos de empreendedores em
um prazo máximo de seis meses.
A ideia é que as chamadas “cidades modelo” possuam poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário totalmente desvinculados do governo
hondurenho. Dessa forma, suas administrações ganham autonomia suficiente
para ratificar tratados internacionais, firmar parcerias bilaterais e
estabelecer sua própria política imigratória.
Um grupo de investidores estrangeiros viajou a Tegucigalpa para
participar da cerimônia e também assinou o documento. O argumento do
governo é de que esta é uma forma de fortalecer a infra-estrutura
nacional, bem como o combate à corrupção e ao tráfico de drogas. “Isso
tem o potencial transformar Honduras em uma máquina de dinheiro, é um
instrumento de desenvolvimento típico de países de primeiro mundo”,
disse à AFP Carlos Pineda, presidente da Comissão para a Promoção de
Parcerias Público-Privadas de Honduras.
De acordo com Juan Hernandez, presidente do Congresso hondurenho, o
grupo de investimentos MGK já se comprometeu a injetar inicialmente 15
milhões de dólares para a construção de infra-estrutura básica na
primeira cidade modelo, na região da costa caribenha. A expectativa do
parlamentar é a de que esta cidade crie cerca de cinco mil postos de
trabalho em um primeiro momento e mais de 20 mil no futuro. Ele também
revelou à AFP que a Coreia do Sul já depositou nos cofres hondurenhos
quatro milhões de dólares voltados para estudos de viabilidade das
obras.
“O futuro se recordará de hoje como o dia em que Honduras começou a
crescer”, disse Michael Strong, CEO do grupo MKGroup em meio à
solenidade de ratificação do memorando. “Nós acreditamos que esta será
uma das transformações mais importantes do mundo, pela qual Honduras
acabará com sua pobreza e criará milhares de empregos”, concluiu.
Não é o que pensam grupos civis e organizações indígenas que
classificam o projeto de Porfírio Lobo como uma “catástrofe”. Ao lado do
local onde será instalada a primeira cidade privada do país, vive uma
grande comunidade de indígenas Garifuna que se opõe ao empreendimento.
“Esses territórios pertencem ao povo Garifuna e não podem ser entregues
ao capital estrangeiro em um gesto de puro colonialismo, idêntico àquele
que prevalecia em Honduras na época em que o país era chamado de
república das bananas”, disse Miriam Miranda, presidente da Organização
Fraternal dos Negros de Honduras.
Oscar Cruz, ex-promotor constitucional, protocolou uma moção junto à
Suprema Corte ainda em 2011 para alertar sobre a inconstitucionalidade
do projeto. “Essas cidades pressupõem a criação de estados dentro do
estado, uma entidade comercial com poderes de estado fora da jurisdição
do governo”, explica Cruz. A instância judicial máxima de Honduras não
concordou com seus argumentos.
“Isso violará os direitos de cada cidadão porque significa a
concessão de parte de nosso território a uma cidade que terá sua própria
polícia, seu próprio Poder Judiciário e seu próprio sistema
tributário”, disse ao jornal britânico The Guardian Sandra Marybel Sanchez, parte de um grupo de manifestantes que tentam apelar à Suprema Corte para reverter a decisão.
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