segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Entrevista com KKE

Reconstrução do movimento comunista e Aliança Popular anti-imperialista e antimonopolista
Entrevista exclusiva com o Partido Comunista da Grécia (KKE), realizada às vésperas do seu 19° Congresso

1. VOZ OPERÁRIA (VO) - Qual foi a postura do KKE diante do fim da URSS (União Soviética)? Houve lutas internas no Partido?
PARTIDO COMUNISTA DA GRÉGIA (KKE) - Na época da contrarrevolução internacional, em 1989-1991, o KKE não estava preparado para lidar com uma ofensiva do imperialismo e do oportunismo de tal profundidade sem precedentes e tão extensiva. A crise do movimento comunista internacional se expressou também no KKE com o conflito de duas linhas principais. De um lado, a linha que defendia a existência de um partido revolucionário da classe trabalhadora e, do outro, a linha que buscou sua difusão dentro de um partido de "esquerda" mais "amplo", sua transformação em um partido social democrata, tendência esta que no final foi voto vencido e deixou o KKE.
O KKE conseguiu manter-se em pé porque seguiu leal ao marxismo-leninismo, porque tinha raízes profundas na classe trabalhadora, uma grande experiência de duros conflitos de classes que se utilizaram de todas as formas de luta, experiência de luta contra o oportunismo.
O KKE defendeu a contribuição histórica da União Soviética e do socialismo do século XX, os princípios fundamentais e as características do partido comunista, a ideologia do socialismo-comunismo científicos, do marxismo-leninismo, do internacionalismo proletário, do centralismo democrático, as leis do socialismo que estavam na mira da ofensiva anticomunista e oportunista.


2. VO - Quais foram as principais iniciativas do KKE que permitiram após 2 décadas do fim da URSS a construção de um partido revolucionário que hoje é referência para os comunistas de muitos os países?
KKE - Depois de 1991 o KKE empreendeu um grande esforço para elaborar uma estratégia revolucionária contemporânea; para traçar conclusões fundamentadas cientificamente a partir do curso da construção socialista e dos fatores que conduziram à vitória da contrarrevolução. Ele tem estado na vanguarda de todas as lutas dos trabalhadores e do povo. Confrontou o nacionalismo burguês, o chauvinismo e o cosmopolitismo do capital.
Em seu 14º Congresso (1991), o KKE tentou resumir as conclusões básicas da crise. O 15º Congresso (1996) foi um marco histórico. Ele elaborou o novo Programa e Estatutos do Partido e a proposta política para a formação da Frente Democrática Antimonopolista e Anti-imperialista (AADF - em inglês). O programa de 1996 superou a visão dos "estágios" em direção ao socialismo e definiu o caráter da revolução na Grécia como socialista, tendo como critério o que é objetivamente necessário e não a correlação de forças. O 16º Congresso (2000) elaborou mais detalhadamente as diretrizes programáticas e os objetivos da AADF. O 17º Congresso concentrou-se na questão da promoção da estratégia do KKE como uma pré-condição para o fortalecimento multifacetado do partido. Ele referiu-se especificamente à situação do movimento comunista internacional e à necessidade de formar um polo comunista no movimento comunista internacional.
Em seu 18º Congresso, o KKE concluiu um estudo e discussão internos ao partido de longo prazo e chegou a conclusões cientificamente fundamentadas sobre a construção socialista na União Soviética e nos países de construção socialista em geral bem como sobre aspectos do curso do movimento comunista internacional.
Após o seu 18º Congresso, estudou a história do partido no período 1949-1968 e tirou lições de importância estratégica através de uma conferência nacional. As conclusões do nosso partido da construção do socialismo e do estudo da história e das lutas estão incorporadas no Projeto de Programa  do partido que será discutido no 19º Congresso do partido. O Projeto de Programa especifica a política de alianças do partido através da Aliança Popular, que terá um caráter antimonopolista e anticapitalista e, nas condições de uma situação revolucionária, vai se transformar em uma frente revolucionária operária e popular que vai derrubar a ditadura do capital.
Ao mesmo tempo, o KKE deu uma grande ênfase à promoção do internacionalismo proletário. Solidarizou-se com os esforços de reagrupamento dos partidos comunistas nos países ex-socialistas, com a luta contra o anticomunismo.
Os Encontros Internacionais de Partidos Comunistas e Operários começaram em 1999 por iniciativa do KKE, que desempenhou um papel de liderança na cooperação dos partidos que têm posições ideológicas convergentes a nível teórico, no âmbito da publicação da "Revista Comunista Internacional". Em geral, consideramos necessária a formação de um "Polo Comunista" pelos PCs que defendem o marxismo-leninismo e a necessidade da revolução socialista.

3. VO - Qual é a avaliação do KKE sobre a atual crise do capital e do cenário dela resultante?
KKE - O KKE ressalta que a crise atual tem todas as características típicas de uma crise cíclica de superprodução e superacumulação de capital, algo que tanto as forças burguesas como oportunistas tentam esconder.
As teses ao 19º Congresso destacam que "a eclosão da crise econômica capitalista generalizada e sincronizada trouxe à tona o caráter historicamente ultrapassado e desumano do sistema capitalista contemporâneo, a possibilidade e a necessidade do socialismo, a necessidade de reagrupamento do movimento comunista internacional, para a emancipação do movimento operário e popular. Ela contribuiu para o agravamento da desigualdade e das contradições interimperialistas, com a mudança da correlação de forças na pirâmide imperialista internacional, para a fluidez das alianças e da ignição de velhos e novos focos de guerra. Qualquer recuperação que tenha ocorrido foi irregular, anêmica, enquanto um novo declínio seguiu na zona do euro e no Japão. O próximo ciclo de crise a nível internacional será ainda mais profundo". Ao mesmo tempo, observa que os perigos de uma guerra imperialista generalizada e do envolvimento direto da Grécia estão aumentando na região.

4. VO - Como se comporta o governo grego diante da crise e da União Europeia (UE)? Quais as expectativas de desdobramentos da crise dentro da Grécia nos próximos anos?
KKE - Todos os governos gregos, especialmente na fase de crise, promovem a estratégia pró-monopólios contemporânea que visa o aumento da taxa de lucro e da competitividade do capital (força de trabalho mais barata, reestruturações reacionárias, privatizações, etc.). Estas são escolhas de importância estratégica para o capital e, por esta razão, elas são promovidos igualmente por forças e governos de centro-direita e centro-esquerda.
A crise vai continuar em 2013, enquanto que um retorno aos níveis de PIB pré-2008 não está prevista para os próximos três anos. Os desenvolvimentos como um todo esboçam duas grandes possibilidades: a escolha de uma nova desvalorização interna com uma nova margem de avaliação da dívida pública e a possibilidade de uma falência descontrolada do Estado, que será combinada com uma saída obrigatória da Zona do Euro. Em ambos os casos o processo de centralização do capital acumulado em um número menor de grupos monopólicos maiores está se intensificando.
Estes desenvolvimentos serão acompanhadas pelo aumento da pobreza em termos relativos e absolutos, bem como pela manutenção da imensa taxa de desemprego, da proletarização, da pobreza dos proprietários independentes de pequenas empresas em áreas urbanas e rurais. Objetivamente, a dificuldade para a classe burguesa na construção de alianças sociais sólidas está aumentando enquanto as condições estão sendo criadas para a promoção da construção da aliança social da classe trabalhadora em uma base melhor e com uma orientação melhorada. O desenvolvimento da crise econômica capitalista, com a perspectiva de uma maior deterioração da vida dos trabalhadores e das camadas populares, bem como a possibilidade de uma recuperação anêmica, vai certamente ter um impacto sobre o desenvolvimento da luta de classes na Grécia.

5. VO - Quais as formas de luta que os comunistas desenvolvem na Grécia? Sob quais bandeiras de luta? Como tem sido a aceitação popular?
KKE - Lutas de classes de massa têm ocorrido na Grécia, numerosas greves gerais e setoriais, greves em companhias, dezenas de manifestações, ocupações de edifícios do Estado e outros. Algumas greves prolongadas ocorreram, a mais característica foi a greve de quase 9 meses na "Greek Steelworks" e a dimensão da solidariedade nacional e internacional, tanto moral como material, para com os grevistas. A característica básica é que o KKE e a PAME cumprem um papel de liderança nestas greves.
Estas greves estão ocorrendo em uma atmosfera de intenso anticomunismo, intimidação dos patrões, organização de ataques provocativos pelos mecanismos estatais e paraestatais. Esta atividade provocativa resultou, até agora, em quatro mortos e muitos feridos, mas não tem refreado a convicção militante da classe trabalhadora. No entanto, o movimento sindical não se reagrupou essencialmente por setor produtivo, nos principais grupos empresariais e na organização no local de trabalho, ele não adquiriu características de massa. Ele não se tornou combativo o suficiente para usar a arma da greve de massas e bem preparada para enfrentar o capitalismo, bem como para enfrentar o Estado capitalista.
No período recente foram tomadas medidas na ação conjunta da PAME com as manifestações de militantes entre os agricultores, os trabalhadores independentes, os jovens e as mulheres. Um fruto desse esforço é a formação de centenas de comitês populares, que têm atividade notável.
A promoção do slogan de desobediência e rebeldia do KKE foi muito importante em relação à proibição de greves, da intimidação do Estado e dos patrões, dos impostos de emergência, dos "impostos pagos por cabeça" ("head-taxes"), na intervenção drástica imediata para reconectar energia elétrica para as famílias das camadas populares, pela abolição dos novos impostos pesados na saúde.

6. VO - Tem-se divulgado casos de atentados contra o KKE, seus organismos e militantes nos últimos meses. A que vocês atribuem esses atos? Qual a relação entre a crise e o crescimento dos grupos fascistas na Europa, especialmente o Aurora Dourada na Grécia?
KKE - Uma característica da reforma do sistema político burguês nas condições da crise é a intensificação do anticomunismo de Estado, assim como o desenvolvimento de representação parlamentar de nacional socialismo/fascismo, a agudização do autoritarismo e da repressão estatal e paraestatal.
A Aurora Dourada é uma organização nacional socialista, fascista. Ela é apoiada por células importantes no Estado e para-Estado e seu papel é o de golpear o KKE, quebrando o movimento dos trabalhadores. Ela é favorecida pela elevação do anticomunismo a uma política oficial de Estado na União Europeia, pela criminalização da atividade e das ideias dos comunistas, a deturpação da história, a equiparação anti-histórica do comunismo com o fascismo e de Stalin com Hitler, que está sendo sistematicamente promovida a nível europeu.

7. VO - O KKE tem falado na necessidade de construção do bloco de forças políticas e sociais anti-imperialistas (que, por sua vez, possui caráter anticapitalista) e antimonopolistas, com o qual temos acordo. Qual é a origem desta formulação? Qual o campo de alianças de classes, frações de classe e organizações políticas que o KKE tem buscado aproximar para a constituição desse bloco?
KKE - O KKE luta pela união de forças antimonopolistas e anticapitalistas na direção da luta pelo poder popular da classe trabalhadora.
Isso se expressa pela Aliança Popular proposta pelo novo programa do KKE que será discutido no seu 19º Congresso, a aliança das seções mais politizadas do movimento trabalhista e sindical e seus aliados que expressam a aliança social da classe trabalhadora com os semiproletários, os trabalhadores independentes pobres urbanos e agricultores, os estratos e classes sociais que têm interesse em lutar contra os monopólios, a propriedade capitalista e as uniões imperialistas (por exemplo, UE, OTAN).
A Aliança Popular atua e é expressada nas fileiras do movimento popular, tem uma orientação antimonopolista e anti-imperialista, promove a ruptura com as uniões imperialistas, luta contra a guerra imperialista e a participação nela. O curso da luta política inclui a possibilidade de emergência de forças políticas que expressam posições de camadas pequeno-burguesas, que concordam de uma forma ou de outra com o caráter antimonopolista e anti-imperialista da luta político-social, com a necessidade de seu direcionamento para a economia e poder popular da classe trabalhadora. O KKE, mantendo sua independência, buscará a ação conjunta com estas forças no apoio à Aliança Popular. A cooperação está se expressando com a atividade conjunta de seus membros e apoiadores nas fileiras das organizações de massa que formam a aliança ou em seus órgãos através de seus membros eleitos. Esta cooperação não é formada num órgão unificado da Aliança composto de partes constituintes, com uma forma organizacional estruturada e estruturas.
A Aliança Popular, nas condições de uma situação revolucionária, será a primeira forma para a criação da frente revolucionária dos trabalhadores que lutará pela derrubada do poder do capital.

8. VO - Quais as iniciativas do KKE no âmbito internacional?
KKE - O movimento comunista internacional permanece organizativa e ideologicamente fragmentado. Ele está experimentando uma situação de crise político-ideológica de longo prazo que coexiste com a atividade corrosiva da forte tendência oportunista e a debilidade dos Partidos Comunistas que lutam sobre a base do Marxismo-Leninismo. Nas condições da crise, das novas exigências ao movimento comunista, sinais relativos a um novo recuo no tratamento dos problemas relevantes de um ponto de vista de classe estão surgindo.
Por esta razão, o KKE, sem abrir mão das formas existentes de cooperação e coordenação dos Partidos Comunistas, está orientado para o esforço de formar um polo comunista entre os partidos comunistas que defendem o marxismo-leninismo, a existência da construção socialista e a sua contribuição, a necessidade da luta pela derrubada do capitalismo e a construção do socialismo.
Ao mesmo tempo, toma iniciativas concretas para promover a ação conjunta e coordenação dos PCs em nível regional. Por exemplo, em 26/1/2012 foi palco do encontro dos Balcãs de PCs, enquanto que em 1-2 de outubro 2012 ele organizou uma reunião de PCs europeus.
O KKE considera como seu dever e obrigação o desenvolvimento da luta política e ideológica, também a nível internacional, contra as forças oportunistas ("redes" de partidos de esquerda europeus), as forças da socialdemocracia, as forças trotskistas, que exercem um impacto ideológico e político sobre o movimento comunista internacional.

9. VO – Algo mais que desejam salientar?
KKE - A história recente tanto da Grécia como do Brasil demonstra que o capitalismo é igualmente perigoso e desumano para os povos, tanto em sua fase de desenvolvimento como em sua fase de crise. Que a classe trabalhadora e as camadas populares pobres não devem encontrar-se "sob a falsa bandeira" de sua classe burguesa para a sua própria valorização nos mercados. Há uma saída e ela deve ser encontrada no caminho da organização da classe trabalhadora, da luta por seus direitos, da aliança social no confronto com os monopólios e seu poder. Os trabalhadores do Brasil sempre podem contar com a solidariedade internacionalista do KKE nesta luta, na luta por seus direitos e pela abolição da exploração.

Fonte: Voz Operária n° 20
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Polo Comunista Luiz Carlos Prestes (PCLCP)
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