quinta-feira, 1 de julho de 2010

CÚPULAS NO CANADÁ

Muito caras para tão pouco saldo

● Organizações não-governamentais consideraram escasso o tratamento dado a temas capitais como o meio ambiente e o combate à pobreza

Elsa Claro

EM 2 de abril de 2009 o presidente dos EUA reconheceu a responsabilidade de seu país como iniciador da crise global ante os representantes do G-20, fórum criado um ano antes e integrado pelos sete países com maior desenvolvimento além da Rússia e de 12 nações de médio ou pequeno porte, entre as quais destacam as chamadas emergentes, quer dizer, aquelas com um ritmo de crescimento atual superior à média e com grandes territórios e população. Eis os casos do Brasil, China e a Índia.


Promissória foi a flexibilização introduzida, ao aceitar a presença daqueles que em outras circunstâncias não teriam sido chamados a consenso, mas o novo fórum, apenas surgido, deixou ver as diferenças existentes e, sobretudo, o inútil de debater assuntos sem pactuar a responsabilidade de cumprir os acordos.


A norma desse fórum não foi a coincidência e muito menos levar à prática aquilo considerado necessário. Embora houvesse suas exceções. Como por exemplo, o bilhão de dólares conferido pelos países ricos ao FMI, dando alento e beligerância a um organismo que não merecia ser ressuscitado.


Na Cúpula realizada em Londres, falou-se de impulsionar uma reforma do sistema financeiro mundial, ditame aprovado depois de vários debates e de duas posições. A norte-americana, que propõe outorgar estímulos fiscais para impulsionar a economia, quer dizer, continuar favorecendo empresas e bancos já favorecidos com dinheiro dos contribuintes e continuar diminuindo os gravames ao setor abastado; e a européia, que advogou priorizar o estabelecimento de regulamentações para as finanças.


Este é o antecedente de Toronto 2010, onde parecia que se repetiria o dito na Grã-Bretanha. Indecisões e contrastes ou embargos inexplicáveis, como são as exorbitantes compensações recebidas pelos banqueiros. Também não existe transparência nos mercados e muito menos naqueles que tratam com valores de risco. Os especuladores continuam atacando os países e as moedas, em situações favorecidas para os setores mais beneficiados, e de desvantagem para o resto dos cidadãos.


"(...) a gente é consciente da jogada arquitetada do capital e dos mercados financeiros. Durante anos os benefícios foram extraordinários com a especulação das hipotecas "suprime" ( de pouco valor e elevada debilidade), sem quase pagar impostos, a custa do endividamento do setor privado; quando o sistema colapsa, conseguem que o Tesouro Público os resgate e lhes mantenha uma fiscalização privilegiada, com a promessa ingênua de reativar o credito às empresas e aos cidadãos que mantêm asfixiados.


Finalmente, aproveitam a fraqueza dos Estados, conseqüência do enorme esforço que supõe dita ajuda, para colocá-los à beira da falência e forçá-los a desmontar o pouco que fica do sistema de bem-estar, empobrecendo injustamente milhões de pessoas, com a cumplicidade das mesmas instituições não democráticas que permitiram aumentar o déficit público em benefício da banca". Assim o explica o professor titular de Direito Financeiro e Tributário da Universidade de Almeria, Miguel Ángel Luque Mateo.


E deve reiterar-se algo usualmente escamoteado em diversas palavras e raras lendas: a dívida pública sobre a qual tanto se fala e que parece inquietar os dirigentes, não procede de partidas dedicadas a satisfazer nenhuma das necessidades sociais.


O endividamento dos Estados foi provocado pelas milionárias ajudas oficiais entregues ao setor privado. Aqueles que governam pensam que a primeira obrigação é proteger o status dos avaros e ajeitar o sistema com limitados e funestos moldes.


DISJUNTIVA


Quem tem a razão? Os EUA expondo que devem manter-se os estímulos do Estado ao capital ou aqueles que na União Europeia querem aplicar impostos às operações dos bancos? Nem todos os países sofreram os mesmos efeitos sobre essas entidades, por tal motivo não lhes interessa nem precisam de fixar taxas adicionais. Outros as rejeitam por serem paraísos fiscais, vivem disso, e também estão os que têm enormes fortunas em condição privilegiada e com enormes lucros nesses lugares.


Washington recomenda manter as medidas de estímulo ( eles o chamam "potenciar o crescimento") entronizado no início do estalido imobiliário estadunidense, medida imitada pela Europa, onde agora preferem um projeto de austeridade fiscal, ainda que "exista o risco de que o ajuste fiscal sincronizado de várias economias possa ter um impacto adverso na recuperação", segundo um comunicado final da Cúpula. Nenhum gravame bancário foi concebido para ressarcir as maiorias prejudicadas pelos salvamentos. As receitas obtidas por essa via não são para aliviar as dificuldades da população. Seriam capital de resgate, de novos resgates, para entidades financeiras em apuros. Existe constância documental de temor a outras medidas de apuro.


Os países industrializados se comprometem a reduzir em 50% seu déficit público em 2013 e posteriormente iniciar outras restrições, expressa o texto da Cúpula. Indeciso e até contrário ao que sugere a experiência. O ministro da Fazenda brasileiro, Guido Mantega advertiu: "Reduzir metade do déficit para alguns países é um ajuste draconiano, quando o médico receita de mais, pode matar o paciente". A presidenta argentina, Cristina Fernández de Kirchner, destacou sobre o tema: "A política de austeridade é um desastre, nós já experimentamos em 2001", ano do cessar de pagamentos sofrido por Argentina, entre outras calamidades que não seria difícil padeçam varias nações nesta etapa.


Vale a pena esclarecer que se os do Velho Continente ou seus parceiros norte-americanos não coincidem totalmente no que deve fazer-se não se trata de contradições de fundo, apenas é um problema formal. Não buscam mudanças, mantêm o mesmo padrão. A diplomacia ou o pragmatismo levam ao mesmo fim, segundo estima Barack Obama.


Existem outras saídas dentro do próprio capitalismo menos dolorosas para as pessoas, inclusive até benéficas para a sobrevivência do sistema, mas se aferram ao modelo atuante, apesar das dificuldades que já provocou em diversas economias. Falta de perícia ou de imaginação? A falta de apoio sólido, o G-20 e o G-8 aceitam que cada qual aplique soluções nacionais por região ou segundo seus interesses. Unidade, império da sensatez mancomunada, são, como a vilipendiada justiça, preceitos que ficam para uma remota agenda mundial.

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